2020 chegou chegando. Joca nasceu no dia 6 de janeiro e, desde então, estou em quarentena. Por conta da pandemia as visitas, que já eram raras, ficaram de lado. A ajuda frequente dos meus pais também. E, desde a segunda quinzena de março, estamos sós – bebê, papai e eu. Os únicos momentos fora de casa são para ir ao pediatra e tomar vacina, de preferência tudo no mesmo dia, numa única saída. O mundo mudou quando meu mundo começou a mudar. E no meio disso tudo, desse novo momento da minha vida e da vida de tantas outras pessoas, em meio à ansiedade, à correria, à insegurança, ao medo e aos anseios de como tudo será e de como seremos daqui pra frente, estou aprendendo a desacelerar - e isso tem me feito muito bem.

MARINA ZYRIANOFF

Joca tem grande responsabilidade nesse processo. Maternar é uma loucura. É maravilhoso, claro. É incrivelmente relaxante e ao mesmo tempo exaustivo. É explodir e implodir o tempo todo. É mix de sentimentos. E fazer isso em plena pandemia, em isolamento social, é extremamente assustador - ainda mais com uma criança tão pequena. Entretanto, também traz o alívio de que, por sorte e privilégio, estamos juntos e no conforto do nosso lar. E aqui podemos tudo! Lar, pra mim, é muito mais do que uma casa. É o que me faz acalmar. Lar, pra mim, é autocuidado. E autocuidado não é, necessariamente e somente, estar com o skincare em dia – este, no meu caso, anda um tanto atrasado. Autocuidado no maternar é estar em paz, estar bem comigo mesma, mesmo que a casa esteja uma bagunça, a fralda às vezes um pouco suja, o brinquedo no chão, a louça na pia, o texto para escrever.

"E autocuidado não é, necessariamente e somente, estar com o skincare em dia – este, no meu caso, anda um tanto atrasado. Autocuidado no maternar é estar em paz, estar bem comigo mesma, mesmo que a casa esteja uma bagunça, a fralda às vezes um pouco suja, o brinquedo no chão, a louça na pia, o texto para escrever."

Claro, é também ter banho quentinho, cama (des)arrumada, roupas confortáveis, vela acesa, café da manhã sem pressa, beber muita água, fazer almoço e jantar gostosinhos e curtir tardes em frente à TV, na varanda lendo um livro ou simplesmente observando o bebê se desenvolver. Pra mim, autocuidado é saber parar alguns minutinhos, inspirar e expirar. E entender que, nestes dias tão intensos em que os sentimentos ficam confusos, complexos e apressados, vale a pena tentar reduzir o ritmo e encontrar valor nas coisas simples, nos detalhes do dia a dia.

MARINA ZYRIANOFF

Com a maternidade eu entendi que autocuidado pra mim é desopilar. Adoro essa palavra. Segundo o dicionário, o verbo transitivo direto na medicina significa desobstruir - o fígado, para deixar fluir o excesso de bile negra, que supostamente causava mau humor e doenças como a melancolia. Por extensão, transitivo direto, intransitivo e pronominal, é fazer esquecer ou esquecer as preocupações ou as tristezas; aliviar (alguém ou a si mesmo) das tensões; alegrar(-se). Na minha visão, é sobre intencionalmente e de forma autônoma buscar aliviar minhas tensões.

Claro, nem sempre é possível se livrar das preocupações. Não é fácil parar ou desacelerar do nada. Mas com o Joca entendi que não adianta eu planejar o dia e enlouquecer se não consegui cumprir tudo o que queria. Não adianta querer riscar as tarefas da lista a todo custo, desejar que o tempo passe rápido, que o dia acabe logo. Porque a verdade é que sempre vai ter alguma coisa que faltou fazer. O que está ao nosso alcance é aceitar esse fato e buscar um dia a dia mais leve, sendo mais flexíveis conosco e com nosso tempo.

E aqui vale desopilar em um banho de 5 minutos, fazendo o almoço ou num breve cochilar – a ideia é tentar deixar o que preocupa só um pouquinho de lado para dar foco a outras coisas que trazem calmaria naquele instante. Porque, afinal de contas, neste mundo louco em que vivemos, só cuidando bem de mim eu posso cuidar bem do Joca – e isso eu só aprendi depois que ele nasceu, emendando com seu nascimento a pandemia.

—Marina Zyrianoff @zyrianoff

Artes: Camilla Belarmino @camibelarmino